Poupar é Para Todos
Todos temos uma visão incompleta do mundo, mas mesmo assim, construímos narrativas completas para preencher as lacunas dessa visão. Isto também é evidente na nossa relação com o dinheiro. A realidade é que as nossas experiências pessoais com dinheiro representam uma fração ínfima do que acontece no mundo - talvez 0,00000001%. No entanto, essas experiências moldam, de forma desproporcional, imaginemos uns 80%, da nossa perceção sobre como o mundo funciona.
Esse desfasamento entre experiência e realidade, pode levar-nos a tirar conclusões erradas, lá porque passámos certas experiências, nada nos garante que saibamos o que se vai passar a seguir. Por exemplo, se enfrentámos dificuldade financeiras no passado, podemos acreditar que no futuro vamos passar dificuldades, mesmo que a realidade global não seja essa.
Além disso, a comparação social agrava essa situação. Frequentemente, comparamos o nosso rendimento com o de pessoas na mesma área profissional e facilmente conseguimos encontrar disparidades. Um exemplo claro é o de um jovem jogador de futebol que, ao integrar a equipa principal de um grande clube, pode ganhar significativamente menos que colegas na mesma posição, apesar de desempenharem o mesmo papel.
Planeamento
Planear é importante. Dado que as nossas perceções sobre dinheiro são frequentemente influenciadas por experiências limitadas e comparações sociais, o planeamento financeiro permite-nos tomar decisões mais informadas e contruir uma base sólida para o futuro, mesmo diante incertezas. No entanto, a parte mais importante de qualquer plano, é reconhecer que as coisas podem não correr como previsto. Parafraseando Scott Sagan Estão sempre a acontecer coisas que nunca aconteceram.
Tomemos o exemplo da reforma, algo que, nos tempos modernos, damos como garantido. Este conceito, contudo, é relativamente recente, existe apenas há duas gerações. Os pais dos nossos avós, provavelmente não tiveram reforma; trabalhavam até ao fim da sua vida. Só porque a nossa experiência diz que a reforma é normal, não quer dizer que no futuro isso seja verdade. Este é um exemplo visível de como devemos pensar nos nossos planos e nas coisas que podem acontecer que não vão ao encontro dos nossos objetivos.
Alem disso, o planeamento também nos ajuda a manter o foco nos nossos objetivos. Um exemplo comum é o de quem começa a praticar algum exercício físico. Muitas vezes, depois do treino, damos por nós a pensar: “Fiz exercício, agora mereço disfrutar de uma bela refeição”. Aqui o fazer exercício é como ser-se rico, a verdadeira riqueza encontra-se em rejeitar essa indulgência (não esbanjar a riqueza) e queimar as calorias que de facto consumimos, mantendo o foco no objetivo. Se o plano tiver em conta essas tentações e desvios, as nossas hipóteses de sucesso aumentam significativamente.
Poupar
Todos nós perseguimos constantemente a felicidade, que está associada à capacidade de fazer o que queremos, quando queremos, com quem queremos, durante o tempo que desejamos. A riqueza pode ser um meio para alcançar esta capacidade.
Gostamos de sentir que vamos no lugar do condutor. Quando somos levados a fazer algo, sentimo-nos desprovidos de autonomia. Em vez de sentir que fizemos uma escolha, sentimos que a escolha foi feita por nós. Isto gera resistência e, recusamo-nos a fazer coisas, que numa situação normal, estaríamos dispostos a fazer de bom grado.
“Ter-se uma forte sensação de que se controla a própria vida é um indicador mais fiável de sentimentos positivos de bem-estar do que quaisquer condições de vida objetivas que possamos considerar.” - Angus Campbell.
Em vez de nos preocuparmos com coisas que não podemos controlar, criando-nos stress ou ansiedade, devemos focar-nos naquilo que podemos controlar. Poupar é um desses fatores.
Não precisamos de um motivo específico para poupar. Devemos poupar simplesmente para nos prepararmos para as surpresas inevitáveis da vida. A poupança não só nos protege contra o inesperado, com também cria oportunidades de fazermos escolhas no futuro, escolhas que ainda nem imaginámos. Mais do que isso, poupar dinheiro, dá-nos controlo sobre a nossa vida e o nosso tempo.
Quem tem a capacidade de poupar
A capacidade de poupar está mais ao nosso alcance do que podemos talvez imaginar. Conseguimos poupar, se gastarmos menos. Conseguimos gastar menos se desejarmos menos. Desejamos menos se nos importarmos menos com o que os outros pensam.
Por isso para conseguirmos poupar mais, devemos ter em atenção o nosso ego. Menos ego, mais riqueza. Não ceder ao ego, permite-nos suprimir aquilo que poderia comprar hoje, obtendo assim mais coisas e mais opções no amanhã.
Ninguém se impressiona mais com as suas posses que o próprio. Quando vemos um Ferrari, podemos pensar que também gostávamos de ter um, e ninguém para além do próprio ficará tão impressionado quando o conseguir.
Tudo tem um preço, mas nem todos os preços vêm com etiquetas. É como dizer que não existem almoços grátis. Ou seja, nada é de graça, o preço pode não ser em dinheiro, pode ser o tempo que gastamos, a atenção que damos, o esforço que requer, ou simplesmente todas as outras coisas que podíamos escolher e não escolhemos.
Realmente, a única forma de sermos ricos, passa por não gastar o dinheiro que temos. É a única forma de acumular riqueza, e a definição de riqueza propriamente dita.
Muito atenção no entanto aos conselhos que seguimos. Vê-se pela internet, muitos “influencers” financeiros, que dão conselhos de como fazer riqueza de forma rápida e fácil. Em vez de procurarmos os casos de sucesso, procuremos os exemplos a evitar, esses vão-nos dar lições mais valiosas. E nos casos de sucesso, não suponhamos que 100% dos resultados possam ser exclusivamente atribuídos ao esforço e às decisões tomadas. Sejamos sensatos em assumir que os resultados surgem com alguma sorte e risco.
Para concluir
Há que respeitar a desordem. Há sempre possibilidade de pessoas inteligentes, informadas e razoáveis, discordarem entre si, isto, porque as pessoas têm objetivos e desejos diferentes. O que funciona para mim, não funciona necessariamente para outros.
Lembremo-nos que nada é tão bom ou tão mau como parece. A expectativa ultrapassa normalmente o que sentimos quando realmente experienciamos.
E com isto, tenhamos também em conta a sedução do pessimismo. O otimismo soa a conversa de vendedor. O pessimismo soa à conversa de alguém que nos está a tentar ajudar. Disse a historiadora Deirdre McCloskey, “Por razões que nunca compreendi, as pessoas gostam de ouvir que o mundo está a condenado”.
O mesmo se aplica às finanças, é mais fácil aceitar que nunca teremos o que queremos do que fazer alguma coisa para que isso aconteça. De uma maneira, nada temos de fazer, da outra, o mínimo que seja, teremos de o fazer.
Este artigo foi inspirado no livro de Morgan Housel, A Psicologia do Dinheiro.